domingo, 26 de abril de 2009
segunda-feira, 23 de fevereiro de 2009
terça-feira, 17 de fevereiro de 2009
Ilusão
Sem nos darmos conta disso, a insatisfação permeia todas as nossas experiências. Mesmo com aquelas que geralmente consideramos que nos proporcionam prazer, e que esse prazer é algo indiscutivelmente associado a essa experiência, não nos apercebemos que esse prazer é o cessar da insatisfação que sentimos entre o desejar viver essa experiência e a sua vivência efectiva. Isso acontece porque ao desejar viver uma experiência à qual associamos prazer e felicidade, automaticamente surge a insatisfação do desejo não realizado.
Mesmo quando erradamente atribuímos a uma dada experiência o potencial de nos proporcionar prazer e felicidade, achamos que esse potencial é inerente à experiência e não ao sujeito que a vive. Se essa inerência fosse real, então todos nós a viveríamos da mesma forma, o que não acontece, pois algo que proporciona muito prazer a alguém pode ser extremamente desagradável a outro, logo a forma como se vive depende do sujeito e não da experiência em si. Além do mais se a experiência desse a garantia de proporcionar prazer e felicidade, então a sua repetição ou continuação infinita não daria lugar à insatisfação como acontece em todos os casos, seja pelo medo (que é uma forma de insatisfação) dos prejuízos que pode causar a sua continuação, seja pela vontade de experimentar algo diferente (que também é outra forma de insatisfação). Não nos apercebendo disso e não vivendo presentes no momento, somos como abelhas que andam de flor em flor, sempre saltando de experiência em experiência, sempre insatisfeitos e sempre à procura do Santo Graal que julgamos ser “desta vez é que é, ISTO é que me trará felicidade e me deixará verdadeiramente satisfeito”.
A juntar a estas formas de insatisfação, existe ainda a de vivermos experiências que rejeitamos, do medo que elas se possam concretizar e do desejo que elas terminem quando se concretizam.
Vivemos num mundo dual em que classificamos tudo como bom ou mau agradável ou desagradável, e com base nisso sentimos desejo ou rejeitamos, o que leva sempre à insatisfação.
Alguns exemplos práticos:
- Quando estamos sentados ou deitados muito tempo, sentimos desconforto, temos de mudar de posição de vez em quando, mas seja qual for a nova posição que escolhamos, acabaremos por nos fartar dela e teremos que mudar para outra. E mais tarde ou mais cedo estamos absolutamente fartos e sentimos uma vontade crescente de nos levantarmos e mexermos, o facto de estarmos sentados ou deitados torna-se insuportável. Após andarmos, pouco a pouco começamos também a fartarmo-nos de andar e estarmos de pé e começamos a sentir vontade de nos sentarmos, a insatisfação do cansaço instala-se. Quanto mais tempo passar maior será essa vontade e mais o facto de estarmos a andar se tornará insuportável. Quando nos sentamos desaparece essa insatisfação e classificamos de prazer essa experiência, mas logo esse “prazer” dará lugar à insatisfação de estarmos sentados e volta tudo ao mesmo.
- Por vezes sentimos vontade de comer algo. Apetece-nos mesmo sentir aquele sabor e aquela textura. À medida que o tempo passa e esse desejo não é satisfeito, sentimo-nos cada vez mais desconfortáveis com o facto de não alcançarmos o que desejamos. Quando finalmente o conseguimos, as primeiras garfadas parecem-nos divinais e classificamos o desaparecimento da insatisfação que sentíamos como um grande prazer. “ISTO é mesmo bom” afirmamos com toda a convicção. Mas com o passar do tempo e garfada após garfada a insatisfação volta a instalar-se, seja com o receio que a comida que temos ao nosso dispor acabe e assim termine a experiência, seja com o começar a estar farto do que achámos que por si era mesmo bom e começarmos a desejar outra coisa, seja porque ficamos com medo de que se comermos demais nos possa fazer mal, seja porque começamos a sentirmo-nos cheios e a experiência passa de agradável a penosa e cada garfada que comemos torna-se um suplício. Pensamos “isto nunca mais acaba” e desejamos ardentemente o seu fim. Geralmente quando comemos nem vivemos plenamente a experiência no momento presente pois estamos focados na próxima garfada e na expectativa do que isso nos fará sentir. E aqui quando se fala de comida, o mesmo se aplica a bebida ou qualquer substância que tomemos para nos proporcionar “prazer” desde o café à heroína.
- Quando estamos sozinhos, sentimos o desejo de companhia, a nossa solidão torna-se penosa, cada vez mais difícil de suportar, é preciso satisfazer o desejo de companhia e enquanto isso não for concretizado sentimos insatisfação que cessa quando finalmente a obtemos. Sabe-nos tão bem não estar sozinhos que sentimos medo de perder a nossa companhia, e pronto lá está de novo a insatisfação. Ao fim de algum tempo começamos a sentir vontade de mudar de companhia ou de “ter o nosso espaço”, de não ter sempre alguém colado a nós o que se torna cada vez mais penoso, começamos a rejeitar a companhia que no início no fez tanta falta e a desejar estar sozinhos. Mais um ciclo…
- Mesmo o grande mito do prazer, o sexo não deixa estar permeado de insatisfação. Desejamos intensamente tê-lo e enquanto não o conseguimos sentimo-nos cada vez mais incomodados. Quando finalmente o obtemos pode revelar-se insatisfatório porque “é sempre o mesmo” e “já farta”, logo sentimos o desejo de “algumas variantes”; porque dura pouco e não corresponde às nossas expectativas o que gera desilusão, porque é longo demais e começamos a desejar que acabe. Mesmo quando foi o “timming perfeito” se nos perguntarem se “vai mais uma” parte de nós responderá que “já chega” e mesmo que “vá mais uma” mais tarde ou mais cedo a insatisfação do cansaço instala-se e surge o cada vez maior desejo que pare. Mesmo quando estamos a fazê-lo não estamos presentes no momento mas a pensar no que virá a seguir e no que gostaríamos que viesse a seguir.
- O grande consumismo a que assistimos nos dias de hoje não tem a ver com a publicidade com que somos bombardeados a toda a hora. Essa publicidade apenas se aproveita da nossa insatisfação e sugere que ela pode cessar se adquirirmos algo. Ao comprarmos algo sentimo-nos bem pois a insatisfação do desejo não concretizado desaparece, mas depressa surge a insatisfação em relação ao que adquirimos e o desejo de obter algo diferente. E lá vamos nós mais uma vez.
- A maioria de nós está insatisfeita com o facto de ter de trabalhar e conta os dias de 2ª a 6ª esperando ansiosamente pelo fim-de-semana, dizendo no início de cada dia “mais um dia” pois é algo penoso. Quando conseguem ir para a reforma, o tédio depressa se instala e anseiam por alguma actividade.
- Alguns de nós anseiam por ter filhos pois seguem o mito da “felicidade” que isso proporciona, pois é algo “muito giro”, ou procuram através de “assegurar descendência” reforçar as referências da sua identidade. Mas associado a isto existem imensas insatisfações: a de que ele pare de chorar, a da perca de liberdade, a de assegurar o seu futuro, muitas vezes colocando expectativas no que gostaríamos que os filhos viessem a ser (o curso, a profissão, o/a parceiro/a, os netos), pois acreditamos que isso NOS satisfaria, o medo que não corresponda a essas expectativas, que adoeça, etc.
- Relativamente às nossas relações é parecido com a anterior. Vemos uma pessoa ou tomamos um breve contacto com ela e logo se geram expectativas em relação ao que essa pessoa poderia ser para NÓS. Desejamos alcançar essa pessoa como via de nos proporcionar felicidade através da concretização das nossas expectativas. Sofremos enquanto não o alcançamos, e depois de alcançarmos sofremos com o medo de perder o que alcançámos ou que esse alguém se modifique em relação às características que tem e que acreditamos nos fará feliz. E se não houver mudança sentimos também insatisfação, seja pela necessidade de mudança nessa pessoa, seja de mudança para outra pessoa (que desta vez é que nos trará verdadeiramente felicidade – julgamos nós). Outras vezes estamos amarrados por laços sócio-culturais a essa pessoa e vivemos constantemente com a insatisfação de termos de estar com quem não queríamos, ou de que a pessoa com quem estamos não é como queríamos que fosse.
- Não poderia deixar de referir as insatisfações que fazem parte da embalagem de se ser humano: a do nascimento pois acarreta dores e desconforto, o da doença (nem preciso explicar porquê), o do envelhecimento (por mais que tentemos retardá-lo ou disfarça-lo, é inevitável e só sofremos perante a evidência do seu avanço por mais que o rejeitemos, sentimos insatisfação pela perda da beleza e vitalidade e pior será quanto mais agarrados estamos a elas. Muitas pessoas de idade desejam a morte, apesar de a temerem, porque o que querem de facto é o fim da insatisfação do envelhecimento) e o da morte (mesmo que racionalmente saibamos que é inevitável sentimos medo perante a possibilidade de perdermos a vida pois estamos apegados à nossa identidade).
Para quem isto parecer demasiado pessimista, então analisem profundamente as vossas experiências e vejam se de facto não são assim. Para aqueles que acham que as coisas são mesmo assim e não há nada a fazer, nem tudo é tão mau quanto parece pois já várias pessoas conseguiram libertar-se totalmente de todas as formas de insatisfação.
111
Esta mensagem é só para comemorar o facto de ter atingido as 111 mensagens. Porquê 111? Porque é um número giro só com "1"s e porque falta imenso para atnigir as 1111.
segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009
Orgulho de ser português
A julgar pela forma como alguns afirmam alto e bom som o orgulho que sentem em ser portugueses, deve ser a coisa mais espectacular, se não do universo, pelo menos deste planeta.
É de estranhar no entanto certos factos que me fazem duvidar se ser português é assim tão bom como o apregoam e realmente motivo para sentir orgulho:
- Alguns portugueses mudam de nacionalidade
- Não existem pedidos por parte das antigas colónias portuguesas em voltarem a fazer parte da nação portuguesa
- Não existem países a implementarem o ensino da língua e cultura portuguesa intensivamente com vista a no futuro poderem ser integrados em Portugal
- Não existem pedidos massivos por parte de pessoas de outras nacionalidades para se naturalizarem portugueses (os primeiros a formularem esse pedido seriam obviamente os espanhóis que desejam não continuar a ser rejeitados como desde 1640)
A conclusão que chego sobre como o orgulho nacionalista tem pés de barro é aplicável a qualquer outra nacionalidade. Não indo muito longe, não vejo por exemplo a Irlanda ou os Estados Unidos a pedirem por favor à Inglaterra para os aceitar de volta, e já que se fala nos Estados Unidos, onde regra geral os seus cidadãos têm muito orgulho em o serem, parece que lá para os lados do Médio Oriente, não existe grande entusiasmo em se tornar cidadão norte-americano e partilhar desse orgulho.E depois, dado que as fronteiras de muitos países não têm sido algo estável ao longo da história, alguém que sente muito orgulho por ser cidadão do país X, se tivesse nascido uns anos antes ou depois poderia sentir esse orgulho por pertencer a um país vizinho, mas mesmo assim diferente.
terça-feira, 13 de janeiro de 2009
Amor/ódio aos famosos
Após ler o excelente post no blog de Paulo Borges "Serpente Emplumada" (http://serpenteemplumada.blogspot.com/2008/12/consideraes-politicamente-incorrectas.html) com um excerto da sua tradução para português do livro "What makes you NOT a buddhist" de Dzongsar Jamyang Khyentse Rinpoche (livro já recomendado neste blog), a ser publicada este ano, resolvi sair da mudez e publicar este post. A frase "Por pura inveja, a sociedade – frequentemente conduzida pelos media – quase sempre faz tombar alguém ou algo que experimente o sucesso" faz voltar à minha mente uma reflexão que faço com frequência ao ler alguns jornais de distribuição gratuita ou ao aceder ao yahoo para ver o meu mail. As notícias que apontam desde o mais ligeiro "descuido" ao mais profundo "defeito" de qualquer um que esteja nas luzes da ribalta são constantes. Desde alguém que apareceu "mal vestido" (leia-se fora de certos padrões que impõem ditatorialmente o que é o bom gosto) numa dada cerimónia, mas mesmo assim com roupa fora do alcance da nossa bolsa; até alguém que manifestou publicamente ou em privado (tendo sido divulgado publicamente contra a sua vontade) um comportamento fora da moral e bons costumes, o qual muitas vezes censuramos mas desejaríamos ter a liberdade de poder também fazer; passando por muitas coisas mais.
Desejamos ter alguém a quem idolatrar, queremos venerar alqueles que alcançam o que desejaríamos ter para nós. Mas ao mesmo tempo que os "amamos", a nossa inveja por eles leva-nos a "odiá-los", a estar pronto a criticá-los pela mais pequena das suas faltas às quais não seríamos na generalidade imunes se estivéssemos no seu lugar. A ironia é tal que chegamos a criticar o luxo em que vivem quando no fundo desejaríamos usufruir do mesmo ou de mais ainda, ou então desdenhamos a estrela que faz um face-lift quando venderíamos pai e mãe em troca da promessa da eterna juventude.
Mas a culpa não é dos media que por um lado constrói os ídolos e pelo outro os derruba, mas antes da nossa inveja motivada pelo nosso sentimento autocentrado e sem o qual todos esses artigos cairiam em saco roto.